sexta-feira, setembro 30

Status: Em manutenção

Tudo o que se usa, gasta. Não necessariamente acaba, mas gasta, desgasta, consome, enferruja. É necessária uma manutenção e, em muitos casos, reposição.
Coisas são fáceis de substituir, máquinas são passíveis de manutenções programadas, o alimento é reposto nas dispensas. Já as relações…
Essas desgastam, cansam, tornam-se obsoletas. Não são de fácil e barata manutenção.
Não tem essa de preservar uma relação fresquinha e viçosa sem que se faça um mínimo esforço para mantê-la. Isso não existe, como não resistem as convicções de que se é querido e admirado somente pelo fato de existir.
Manutenção do próprio ânimo, dos planos e desejos, da energia necessária para levantar todos os dias e encarar a vida!
Manutenção das amizades, das importantes e necessárias lembranças de afeto e saudades, carinho e dedicação.
Manutenção das relações familiares, ainda que complexas e sem novidades, cansativas e muitas vezes desgastantes.
Manutenção do amor, através da própria crença em sua existência, ainda que sem correspondência ou direção.
Manutenção da saúde, da própria vida, em sinal de respeito e auto-consideração.
Manutenção enfim, de tudo o que desejamos ardentemente preservar, do que faz verdadeira e válida a vida.
Se não há manutenção, haverá perda. Mais futuramente, haverá desgaste irreparável, inconsolável.
Como um elevador que trabalha sem interrupções, a vida tem seus altos e baixos, suas paradas e retomadas. A rotina é ligeira e quase nos faz esquecer das paradas programadas, das verificações de engrenagens, detecção de cansaço e desgastes.
Mas, para preservar e manter o bom funcionamento, antes que um defeito ou mesmo uma parada total aconteça, é sempre recomendável fazer aquela pausa, desacelerar, repensar, entrar no modo de segurança e fazer os devidos ajustes.
Afinal, é pelo nosso elevador privativo que andam os nossos afetos.
Para afastar qualquer arrependimento ou culpa, antes que seja tarde, é recomendável pendurar a plaquinha: EM MANUTENÇÃO.

quinta-feira, setembro 29

Livrai-me de perder tempo tentando impressionar

Eu começaria uma oração assim e faria as promessas necessárias para garantir êxito. A missão de impressionar me parece, além de um castigo interminável, uma extenuante e infrutífera perda de tempo.
Impressionar é causar alguma impressão, mas não necessariamente a impressão desejada. Ainda menos garantido é o retorno esperado. Nós, pessoas, somos extremamente exigentes com os outros, implacáveis, imperdoáveis. Ainda que impressionados, arrumamos um jeito de criticar e desvalorizar.
Tentar impressionar é tirar o foco de si mesmo e projetá-lo no outro, é fazê-lo protagonista da sua história. É implorar a provação desnecessária, abrir mão da satisfação pessoal e se submeter aos critérios alheios, muitas vezes duros e injustos, motivados por desprezo, malícia, leviandade, indiferença e até mesmo, inveja.
Uma vez aberta essa porta, por ela passam todas as opções possíveis, desde votos encorajadores e incentivadores, até a famosa torcida contra, determinada a estragar qualquer chance de vitória.
Quando você se esforça para impressionar, se coloca numa posição delicada, fazendo saltar fragilidades e traços vulneráveis. Não tente impressionar, não se esforce para chamar a atenção, não se troque por uma crítica displicente.
A tentativa de impressionar revela insegurança. É mira equivocada num alvo imaginário.
Dica boa para deixar o tempo trabalhar a nosso favor: Nenhum esforço justifica o julgamento alheio, nenhuma iniciativa é recompensada se não for em proveito próprio. A quem dermos o poder de julgar, também terá o controle de nossas opções.
Não impressione, viva! Discreta e indiretamente esse movimento impressionará muita gente. E mais do que isso, inspirará!
Se quiser mesmo ter visibilidade e reconhecimento públicos, realize algo notório, admirável, inesquecível. Se não for possível, use a discrição como aliada, o livre arbítrio como ferramenta e seu próprio julgamento como moderador.
E então, sem mais nenhum esforço para impressionar, haverá tempo e disposição de sobra para desfrutar a vida de forma IMPRESSIONANTE!

segunda-feira, setembro 26

Inadimplências

Hoje recebi uma cartinha carinhosa. Tão carinhosa que custei a perceber que se tratava de uma cobrança. Esqueci de pagar o boleto de um curso e então me enviaram o lembrete afetuoso, mas firme. As entrelinhas diziam claramente: – Apesar de gostarmos muito de você, há um compromisso não cumprido na nossa relação.
Me envergonhei pela displicência e gastei um bom tempo pensando nas inadimplências da vida.
Não cumprir um compromisso por falta de recursos exige, sem dúvida nem hesitação, que se dê uma satisfação. É o mínimo que merece o credor, já que não vai receber o acordado.
Deixar de realizar um prometido é igualmente uma dívida não justificada, uma inadimplência. E como nos tornamos devedores pela vida afora.
Ficamos devendo aquela ligação de aniversário, a receita da sobremesa tão elogiada, uma ligação para o medico para avisar que não iremos comparecer, a doação que prometemos para uma causa que nos tocou, um tempo para gastar com aqueles planos de qualidade de vida e muito mais.
Dívidas são inconvenientes, aborrecidas, magoáveis, difíceis de esquecer. Muitas vezes são a razão de uma bruta insônia. Ficar devendo não é o mais grave. Pode acontecer. As circunstâncias são diversas.
Ruim é fingir esquecimento, se esforçar mais por desculpas do que pelo cumprimento, desviar toda a vida para não topar com o credor. Já aí a inadimplência faz casa e dita que veio para ficar. E as dívidas só tendem a se acumular.
Prometer é um ato banal. A responsabilidade sobre a promessa é outra coisa!
Se crédito já é um perigo para as finanças, imaginemos no campo pessoal, que envolve confiança, esperanças, sentimentos, emoções. Para esse tipo de inadimplência, não tem dinheiro que pague.
Por tudo o que a expectativa de um acordo não cumprido pode gerar, eu fico com a citação de um autor desconhecido que diz muito sobre usufruir, cumprir e se despedir:
“Beba moderadamente, pague honradamente e saia amigavelmente.”

terça-feira, setembro 20

Inadequada, eu?

Quantas vezes já me senti inadequada? Incontáveis vezes. Quantas vezes já sofri por isto? Todas elas.
De fato, relembrando aqui, já senti bastante inadequada. Pelo que falei, pelo que deixei de falar, pelo que pensei em falar, pelo que nem cogitei…
Por ter me vestido de menos, demais, combinando, relaxando, escandalizando…
Por ter telefonado na hora errada, ter forçado uma coincidência, deixado alguém na mão, elogiado a pessoa errada, ignorado quem não merecia…
Pelos julgamentos apressados, pelos preconceitos velados, pela falta de consistência em argumentos inúteis, por ter perdido a chance de calar.
Estar inadequado é estar fora do contexto, da direção que um tema segue, da evolução dos fatos. É nadar contra e se afogar em contradições.
Sentir-se inadequado é perceber-se fazendo ou sentindo algo que grita contra a sua natureza, mas sem reação forte o bastante para recuar.
Não notar-se inadequado é deixar-se cumprir aquele papel incômodo, ridículo, vulnerável, contestável, tantas vezes lamentável. É ser o tolo da vez.
Em todas as instâncias, o sentimento ponteagudo de inadequação mostra que, dentre os caminhos possíveis, acabamos escolhendo o que não nos comporta, não nos suporta, não nos dá passagem fácil. Saímos dele envergonhados e muitas vezes culpados.
Para compensar, não fui inadequada todas as vezes em que pensei antes de falar, julgar, discutir e discursar, ainda que a vontade fosse forte e a platéia, atraente.
Não fui inadequada quando me olhei verdadeiramente no espelho e me senti bem para mim e não para os outros, aceitei meu corpo, minhas formas, meu andar, meu olhar.
Nem quando tomei uma atitude certa do que estava fazendo e não só para impressionar, quando disse sim apenas quando quis dizer sim, e não quando era a única resposta que cabia.
Por fim, colocando tudo na balança, parece que é parte habitual da gente, esse sentimento estranho, esse sapato de número trocado, mal calçado, inadequado.
E se é inevitável que sejamos inadequados em certas ocasiões, que sejamos tanto mais leves e divertidos quanto poderá ser a nossa gafe.
Essa ainda me parece a forma mais adequada de lidar com uma atitude inadequada.
Publicado em Conti Outra em 20/09/2016.

sábado, setembro 17

E hoje vamos de...

Vaidade! É uma época estranha essa, de tentativas exacerbadas de tornar públicas as nossas importâncias e ignorar completamente as importâncias alheias. Mais do que isso, a materialização do ato de falar sozinhos, ou, em outro ângulo, falar para todo o mundo.
E hoje vamos de… sucesso, exclusividade, prioridade, sensacionalismo. Vamos para onde? Vamos com quem? Quem queremos que receba a informação da nossa ilustre e cobiçada rotina?
Será que nunca vamos de TPM, enxaqueca, roupa amassada, programa furado, conta virada? Vamos, claro que vamos, mas isso não dá audiência.
Vamos também de fofoca, de achismo, de provocação. Vamos indolentes, sem maiores preocupações.
Vamos sem tempo nenhum para olhar para os lados, valorizar uma virtude de fora, tentar minimamente o esforço de uma autocrítica, uma desaceleração na corrida pelo topo.
Vamos indiferentes, sem levar em conta que o outro é o nosso verdadeiro espelho. Vamos no atropelo, gastando o fôlego da vida com coisas miúdas, perdendo momentos mágicos para um registro frio e marcador de território. Fincamos bandeiras onde deveríamos construir um espaço comum.
E hoje vamos de… solidão desmascarada pela verborragia, status encomendado, popularidade passageira.
Não vamos. Estamos. Estamos fazendo uma força hercúlea não deixar cair o nível da vida perfeita que precisamos apresentar. Estamos abrindo as portas de uma intimidade projetada, já sem qualquer sinal de espontaneidade.
Para onde vamos? Alguns de nós, mais longe ainda, na tentativa incansável de virar mitos e musas. Outros de nós, seremos vencidos pelo cansaço e faremos a cansativa e suada viagem de volta a nós mesmos, a quem negligenciamos, aos lugares, coisas e pessoas, que, embora nem sempre tão lindos nas fotos, são os que confortam e alimentam nossos corações.
E enfim hoje vamos de… o que somos quando ninguém está nos observando.
Publicado em Conti Outra em 16/09/2016.

quinta-feira, setembro 15

Corações inóspitos

Não são propriamente indiferentes, não são obviamente insensíveis, não estão em condição de superioridade ou imunidade. Também se abalam, sofrem, murcham, vivem a perseguição implacável do vazio de amor.
Corações inóspitos são os que, embora queiram e precisem do companheirismo das relações do mundo, são totalmente inábeis, não possuem a capacidade de manter um ambiente amistoso, recuam e acuam sem a menor explicação nem cerimônia.
Ai de quem se encanta por um coração inóspito. Se de primeira pode parecer apenas uma reserva ou timidez, quando a coisa fica visível, a aspereza já fez seu estrago.
E nessa hora não se sabe pelo que mais se lamenta. Se pela decepção de um julgamento inocente ou se pelo pobre e miserável coração, que não economiza defesas para manter longe quem o quer bem.
E sem ilusões de que esses corações não amam. Amam e sofrem de amor. Todo mundo ama, até mesmo os brutos, os rudes, os inóspitos!
Mas, para tristeza deles e desilusão de quem os deseja, não conseguem manter por perto os seus afetos. Sofrem e fazem sofrer.
Não confiam, não relaxam, não compartilham momentos, experiências, medos, dúvidas. São desconfiados porque conhecem suas naturezas traiçoeiras.
Corações inóspitos são casas inabitáveis. São fachadas tantas vezes lindas, modernas, atraentes, mas que guardam um interior sombrio, gelado, insalubre.
Corações inóspitos podem parecer simpáticos, divertidos, interessados e interessantes. Mas, passada a primeira e ilusória impressão, se apresentam formalmente e se revelam então, nada hospitaleiros.
De verdade, é uma dureza e uma rudeza conviver com eles, mas sempre pinga um na família, no grupo de amigos ou nos ambientes de trabalho. Bom para quem se blinda logo na partida e não exige o que não conseguem dar.
Inóspitos como pântanos, lhes resta a consciência do que são e como afetam outros corações, e, quem sabe – e não devemos jamais fazer condenações eternas – a vontade de mudar e deixar brotar vida onde nada havia.
Publicado em Conti Outra em 14/09/2016.

domingo, setembro 11

Se você tem a obrigação de pagar suas contas, obrigue-se também a acordar feliz!

Primeiro a obrigação, depois a diversão! Uma frase popular e muito repetida aos preguiçosos. A carapuça que serve em quem a coloca.
Mas, via de regra, há muito já se aplica essa regrinha básica. Associamos que a diversão, a alegria de viver são consequências dos recursos que temos, depois de todo o trabalho cumprido, com ou sem qualquer prazer.
Acordamos mau humorados, pensamos nas tarefas do dia, nas pessoas que encontraremos e temos o impulso de voltar para a cama, nos esconder debaixo da roupa de cama amarfanhada.
Nessa hora não somos capazes de reconhecer que por mais um dia abrimos os olhos, estamos respirando, teremos um dia inteiro para desfrutar, ainda que com grandes e pesadas obrigações, alguém lembrará de nós e enviará uma mensagem, uma figurinha, um alô e nós também faremos o mesmo para retribuir, ou não. Que pena.
A vida é cheia de tribulações, os dias repletos de leões para domar – jamais exterminar, as horas de trabalho são injustamente muito mais numerosas do que as horas de ócio ou prazer, mas essa é a dinâmica e nosso mau humor ou indiferença não farão a menor diferença nos prazos ou nas entregas que são de nossa responsabilidade.
No máximo conseguirão interferir nas relações que vamos colecionando vida afora, e, com algum esforço, poderemos ganhar o título de personas non gratas pelas carrancas e palavras atravessadas que lançamos pelo caminho.
Agora, pensando alto e forçando muito a barra para desconstruir essa cultura: E se tivéssemos a obrigação de acordar felizes e gratos todos os dias, da mesma forma que temos de trabalhar e pagar as nossas contas?
Quem não gostaria de conviver com uma pessoa assoberbada de trabalho e ainda assim, bem humorada e radiante, cumprindo suas obrigações, planejando suas diversões, nutrindo bem as suas relações?
Obrigue-se você também!
Publicado em Conti Outra em 09/09/2016.

quinta-feira, setembro 8

Levei um tombo e uma lição

O chão é duro de pisar, mais duro ainda de cair, mas acontece sem aviso, preparação, modos ou cabimento. Basta um segundo para a perspectiva ser outra, a mais rasteira possível.
Quando minha filha era pequena e caía, eu costumava bater tantas palmas e exclamar sorrindo, que ela chegava a provocar novos tombos, para repetir as comemorações. Mas, até aí, funcionava bem a coisa de evitar as lágrimas e a mágoa de se expor dessa maneira tão patética. Tanto a bundinha de fralda quanto o abraço da mamãe confortavam a queda e os raladinhos.
Mas a gente cresce e endurece. E cada tombo vai deixando uma marca, uma lembrança, uma cicatriz, um receio. Eu já levei tantos e de tantas formas que nem vergonha sinto mais. Mas dor ainda sinto.
Um tombo pode tirar a gente da concentração, do sério, do prumo, da bobeira. Um tombo pode dar sérios problemas, um leve susto, um gesso, uns dias de folga, um motivo para pensar…
Anteontem levei um tombo e, refazendo a cena, não há dúvidas: Foi literalmente um desabamento. As pernas não aguentaram o peso do coração. Eu vinha jurando que estava ótima e que nada no mundo me abalaria, mas, uma depressãozinha no asfalto, um pé que bambeou, e lá fui eu para o chão, deixando minha dor marcada no piso e carimbada no joelho.
Uma queda rápida e um choro sentido, magoado, saudoso, desamparado. Chorei de dar dó. Mais do que o joelho sangrando, chorei pela distração de não prestar a devida atenção aos sentimentos que me rondavam.
Chorei por ter que aprender mais uma vez que saudade não se reprime, que solidão não se ignora, que tristeza só vai embora quando pode entrar e ficar pelo tempo que precisa para se transformar. Chorei um luto que ainda não havia chorado. O tombo me ensinou!
A dor já se foi, levando com ela toda aquela agonia que estava represada. E, como se agora eu fosse a filha, e de fato sou, ouvi aquela voz dizendo: Passou! 
Valeu, mãe, agora eu entendi.

quinta-feira, setembro 1

Deseje felicidades com vontade!

Deseje como se fosse para você, felicidades intensas, surpreendentes, adoráveis, inesquecíveis. Deseje com o seu coração, apele para o seu senso de reciprocidade e deseje até mesmo a felicidade que você tentou para sí e ainda não chegou lá.
Um voto de felicidade frio e para cumprir protocolo é mais feio do que nada dizer.
Desaponta quem recebe, desmerece quem o faz.
Desejar felicidade para o outro não diminui a chance de tê-la junto de sí, ao contrário, só aumentam as chances.
Feliz de quem consegue desejar o melhor, sem ser dominado pela própria mesquinharia e pensamento exclusivista, de se colocar sempre em primeiro lugar.
Viva as congratulações como parte delas, como peça fundamental para fazer o momento de alguém muito especial. Ponha-se de lado um instante e perceba como é bom ser parte de um todo, de um voto coletivo.
Muitas vezes, apesar do amor ser presente, há uma dificuldade em assistir e vivenciar as manifestações de carinho para outra pessoa. Somos seres ciumentos e infantis.
Dedicar os pensamentos mais bacanas para uma celebração, qualquer que seja, é um exercício intenso de oferecer o primeiro plano com sinceridade.
Não adianta elogiar e logo depois lançar aquele olhar invejoso.
Não vale expressar os desejos mais elaborados, mas repetir para dentro: – primeiro eu!
Abandone aquele aperto de mão preguiçoso, aquele abraço sem gosto, o sorriso forçado.
Abrace forte, mais de uma vez, provoque uma risada gostosa, chore se a emoção pedir.
Gaste com vontade seus desejos de felicidades eternas, sucesso, surpresas, reconhecimento, paz, saúde, sonhos delirantes e amor infinito!
Neste caso, quanto mais se gasta, mais se recebe de volta, na mesma medida de sinceridade e honestidade.
Felicidades, sempre!
Publicado em Conti Outra em 01/09/2016.